

vacaciones
como se procurasse Paul Valéry
os velhos morrem
como se não pudesse
mais ir embora
e assim…
como o tempo e a luz
as monções dos amores jovens
pouco debruçam
meu desejo dormir e acordar
em um cemitério marinho*
…esse teto tranquilo, onde pombas andam*…
eu seria o coveiro que nomeia
os próprios seres
* Sampler do nome de um poema de Paul Valery
*Sampler do mesmo poema de Paul Valery (Cemirério Marinho)
brincando de equilíbrio
espelhado em ee cummings
como se não bastasse olhar
de olhos fechados
as tuas palavras em malvas
o que há dentro do limo
que um mistério não cure…
sob uma locomotiva cuspindo violetas*
o amor está
…onde o desenham
nalgum lugar
em que nunca estive*
* Sampler de um poema de ee cummings
* Sampler de um poema de ee cummings
água morna
não chegue a distância
de um palmo de algo que você
tanto quer
deixe os olhos gravarem este defeito
de simplificar as coisas
….
a criança tirava o pulso da irmã
com uma açucena
em brincadeira de misturar
a terra
corria pela veia um feixe de cristal
….
quanto a você
não atravesse até o lado de lá
o rio desagua
em superfície perene
uma pessoa normal
você tem noite nos dedos
rindo ironicamente como uma
esferográfica que borra
nós somos cobrados por nossos resultados
a tua ausência de alguma forma
sempre me fez escrever
um pouco mais sobre o mar
se o céu tivesse uma lua
você se arrependeria naquele momento
até te olhares no espelho… dizer
tu poderias ter sido uma pessoa melhor
mas fostes a ti mesmo
ao parar
há um desfiladeiro nos teus olhos
a que eu chamo eternidade
tua voz seria uma grama que se move
nada mais caberá
do que aprouver em mim cabe em asa
ainda me abre
nave
quando usava o tabaco
e esperava um museu brotar na alma
arrebatou sangue exagerado
um punhal que procurava
e cravara no peito
como um poema morto
disse sou uma árvore num penhasco
que consome tais pessoas
nesta maldade terra
crianças ganhando garoa
escondi – me atrás de um alfinete
para que você não pudesse ver o meu amor
caído comendo pedaços de metais
os gestos dissolviam mais frágeis
era possível nivelar os reflexos
hoje vou cantar com tufos de orvalho
engastado na garganta
se a caso o dia não vier
é porque eu preferi
dormir com o rosto encostado
na parte seca da eternidade
quase mas a garota
a chuva torrencial humildemente
abrigava a estrela
no chão a água se disfarçou de atleta
corria pela sarjeta
abriam pequenas conchas
a calçada em espanto continha frisos metálicos
então a menina finlandesa
me chamou no vazio
perguntou em soluços
porque sempre em dias de abandono
e carinhos carbonizados
chove dentro do homem
jeans
se um galho gris
firmar sua calça
esguia
um pássaro
de brim faz o seu ninho
outro
sobre a ternura
falo de amor apenas
com os olhos saídos de areias imaginadas
céu de durar poucas violetas
e saúvas no sol da terra
debaixo da noite saudável
sempre repousa uma estrela órfã
como quando se decide habitar na solidão para viver
morar futuros humanos
morrer sob os passos de alguma fera
eu entendo o amor
como um pássaro que sobrevoa
um país extinto
e não consegue nos ver


Leonardo Bachiega
Leonardo Bachiega, é arquiteto, urbanista, poeta e dramaturgo. Nascido em São Paulo, hoje reside próximo à capital paulista. É autor de alguns livros de poesia e um de dramaturgia e possui poemas publicados em diversas revistas literárias do Brasil e Portugal. Os poemas desta leva, estão no livro Solfejo de Cores, publicado em 2021. Fernando Pessoa é seu poeta da vida.